ricardo_kotscho |
"Isso sempre foi assim.
Estas barganhas sempre existiram, qual a novidade? Não entendo a tua bronca.
Você está ficando um velho ranzinza ou perdeu a memória?", bronqueou
comigo um velho colega jornalista, mais cético do que cínico, enquanto a gente
comentava na padaria o noticiário sobre a MP dos Portos, que não sai mais das
manchetes.
"Isso" a que ele se
refere é o Congresso Nacional e o seu relacionamento com o Executivo, que nos
últimos dias transformou a política nacional num inacreditável fim de feira em
que ninguém mais se preocupa sequer em manter as aparências.
"Governo negocia liberar R$
1 bi para aprovar MP", anuncia a manchete da "Folha", como se
"isso" fosse a coisa mais normal do mundo no momento em que se
discutem novas regras para promover investimentos privados nos sucateados
portos nacionais.
Em desespero de causa, já que
caduca na quinta-feira a MP 595 que estabelece novos marcos regulatórios para
os portos, o governo acionou seus principais ministros na segunda-feira para
"convencer" os partidos a votar a medida dentro do prazo, mas não
houve jeito. A votação acabou adiada para a manhã desta terça-feira, e depois
ainda terá que ser discutida no Senado.
Qualquer que seja o resultado da
votação, e a esta altura ninguém sabe qual foi o efeito da liberação de verbas
para as emendas parlamentares, o fato é que acabou esta história de hierarquia
eclesial no Congresso Nacional. Está tudo dominado: quem manda agora é o chamado
"baixo clero", que passou a ser o porta-voz de "altos
interesses", resguardando seus chefes clericais. É a tal história: se o governo não libera
verbas, outros estarão dispostos a fazê-lo com o maior prazer.
Por onde andam as grandes
lideranças partidárias que nestas horas apareciam para colocar ordem no circo e
um pouco de civilidade no debate? Quando diziam a Ulysses Guimarães, um dos
últimos desses grandes líderes parlamentares que tivemos, que este é o pior
Congresso que o país já teve, ele apenas sorria de lado: "Você diz isso
porque ainda não viu o próximo...".
Cito apenas o amigo doutor
Ulysses para não ser injusto e esquecer os nomes dos muitos outros políticos da
melhor qualidade com quem convivi no Congresso Nacional _ até mesmo, e eu diria
principalmente, durante os piores períodos da ditadura militar. Em
compensação, hoje temos novos heróis
como Eduardo Cunha, Marco Feliciano...
Outro dia comentei aqui sobre o
envelhecimento precoce do PSDB pela falta do surgimento de novas lideranças,
mas o mesmo vale também para outros partidos representados no Congresso
Nacional. "Somos um eleitorado em busca de um partido", reconhece o
próprio senador Aloysio Nunes Ferreira Filho (PSDB-SP), um dos expoentes do grupo
de José Serra.
As coisas realmente mudaram
muito. No meu tempo, quando os senhores do "baixo clero" ainda não
haviam se tornado dominantes, eram os partidos que buscavam um eleitorado para
chegar ao poder, sem a ajuda do Supremo Tribunal Federal e da Procuradoria
Geral da República.
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