A resposta é simples: para que fossem publicadas reportagens positivas sobre Joaquim Barbosa.
JB entre o diretor do Globo e João Roberto Marinho de óculos) numa premiação: proximidade indevida |
O que leva alguém a pagar uma
viagem para jornalistas?
O leitor pode se fazer essa
pergunta, depois de saber que uma jornalista do Globo viajou para a Costa Rica
‘a convite’ do Supremo, para cobrir falas de Joaquim Barbosa.
A melhor resposta é a mais
simples: você paga porque deseja aparecer. Você quer que sejam publicadas
reportagens sobre você. E como você pagou, está compreendido que a cobertura
será positiva.
O STF queria, portanto, que o
Globo fizesse textos sobre Joaquim Barbosa que, no fundo, seriam muito mais
publicidade do que jornalismo.
O problema aí é o seguinte: qual
o interesse público que justifica o STF gastar dinheiro do contribuinte numa
operação destinada a engrandecer apenas e apenas Joaquim Barbosa?
Nenhum.
Mais do que as cifras envolvidas,
o que chama a atenção é a atitude das duas partes: o STF por ter “convidado” e
o Globo por ter aceito.
Está claro que o que moveu
Barbosa foi a vaidade. Teria ele se
viciado em aparecer no noticiário, vencido pelo deslumbramento?
É uma possibilidade.
Se Brian Leveson, o discreto juiz
que comandou as discussões sobre a mídia na Inglaterra, fizesse algo parecido –
não faria, vamos logo dizendo – sua carreira estaria automaticamente liquidada.
A organização jornalística que
fizesse o que o Globo fez cairia em completo descrédito, também.
O interesse público ordena que os
poderes – a mídia incluída — mantenham
distância rigorosa, por razões óbvias: eles devem se fiscalizar uns aos outros.
Em nome da transparência, a mídia
deveria investigar e publicar qual é o orçamento do STF. De quanto dispõe para
despesas como aquelas relativas à viagem? É dinheiro do contribuinte. Mas
quando existe proximidade isso jamais acontece.
Na grande frase de Pulitzer, um
dos maiores editores da história do jornalismo, “jornalista não tem amigo”.
No Brasil é diferente, e é uma
pena. Você vê o ministro Gilmar Mendes confraternizando – à luz do dia – com
jornalistas como Reinaldo Azevedo. (Aquele que escreveu, contrito, que Maggie
Thatcher morreu “pobre”, com sua casa em Londres avaliada em 13 milhões de
libras.)
Você vê o jornalista Merval
Pereira acertando um prefácio – abjetamente bajulador — de um livro com o
ministro Ayres Brito em pleno julgamento do mensalão.
E depois somos obrigados a vê-los
lado a lado em sessões de lançamento do livro.
Isso tem um nome: corrupção nos
costumes.
Dias atrás, jantei com um amigo,
brilhante jornalista, e ele me contou uma história exemplar. Seu pai, nos anos
1940 e 1950, foi juiz. Com frequência, recebia telefonemas de advogados que
queriam marcar uma conversa. Jamais ele aceitou. Repito: jamais. “Quer
conversar? Muito bem. Então vamos marcar uma conversa no Fórum, diante do
escrivão”, dizia o juiz.
Não era exatamente este tipo de
conversa que eles procuravam, naturalmente. Mas é assim que um juiz deve se
comportar. Semanas atrás, os brasileiros souberam que um advogado estava
prestes a pagar um superfesta de aniversário para Luiz Fux, do Supremo.
Perdemos a noção?
Merval, Gilmar Mendes e Ayres Brito: essa proximidade não é nada boa para o interesse público
|
O Diário confia em que vai chegar
o dia em que a sociedade olhará para essas coisas e se perguntará: como
toleramos tudo isso, como aceitamos todos esses insultos?
Considere o interesse público.
Imagine que vá dar no STF uma
disputa bilionária entre a Globo e a Receita Federal.
Que isenção o “Zé do Povo” — para
empregar a expressão reveladora usada pelo patriarca do Globo, Irineu Marinho
— pode esperar dos juízes do Supremo?
Foi com imensa satisfação que
nós, do Diário, vimos a repercussão do texto sobre a viagem patrocinada pelo
STF.
No momento em que escrevo, são
quase 6 000 likes e 500
compartilhamentos no Facebook e 515 retuítes. Fora do Diário, o artigo foi
reproduzido em todos os sites relevantes
do Brasil.
Isso é auspicioso por uma razão:
mostra que a capacidade de indignação do brasileiro não está adormecida.
E este é o primeiro passo para
que as coisas mudem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário