Greve de fome de prisioneiros palestinos questiona atuação de Israel na CisjordâniaHá presos sem comer há 264 dias; protestos são contra forma de detenção de palestinos soltos em acordo com Hamas
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| Arturo Hartmann |
O prisioneiro palestino Samer
Issawi chega nesta quinta-feira (11/04) à marca impressionante de 264 dias em
greve de fome. Preso em 2004, ele cumpria pena de 30 anos até ser solto no
acordo entre Hamas e Israel, no fim de 2011, na troca de 1.027 presos
palestinos pelo soldado Gilad Shalit.
No entanto, em julho de 2012 ele
foi preso novamente baseado no artigo 186 da Ordem Militar 1651 (Sobre
Provisões de Segurança), efetivada em maio de 2010.
A Ordem diz que “se o condenado
viola a condição da mitigação condicional de sua punição dada sob a Seção 184,
o comitê deve ordenar o cancelamento da mitigação da punição”. Assim, o Artigo
186 do Capítulo E (Julgamentos e Procedimentos) indica que “o comitê deve
obrigar o condenado a servir um termo de prisão igual ao período que começa com
o dia de sua soltura e vai até o fim do termo de prisão que ele teria servido
caso sua punição não tivesse sido mitigada”.
Manifestações dos prisioneiros também
gera protestos nas ruas da Cisjordânia
Sahar Francis, coordenadora da
Addameer (Associação de Direitos Humanos e Apoio a Prisioneiros), em entrevista
a OperaMundi, disse que na prática esta é uma forma de permitir ao Governador
Militar prender os libertados em acordos de troca, mesmo que não tenham
cometido nenhum crime. No caso de Issawi, palestino de al Issawiya, bairro de
Jerusalém Leste, ele violou sua soltura entrando na Cisjordânia. “Samer afirmou
que tinha o direito de visitar amigos em cidades ao redor de Jerusalém. Mas por
isso ele pode ter que cumprir os 20 anos restantes da pena original. Legalmente
é ridículo. Foi feito um ano antes para minar o acordo de troca”, diz Sahar.
Boletins desde sábado mostram
crescente receio de que Issawi possa morrer em breve. Na terça, médicos da
Sociedade de Prisioneiros Palestinos demonstraram preocupação com seu coração,
cérebro, pulmões e rins. Sua morte seria a primeira do movimento de greve de
fome que se iniciou em dezembro de 2011, com Khader Adnan, em protesto contra o
uso de detenção administrativa por parte de Israel (prisão sem acusação ou
procedimentos de julgamento). E seria mais uma das faíscas que ligam as prisões
israelenses à rua palestina.
O início de 2013 viu a escalada
de erupções da resistência violenta nos territórios ocupados ligada às prisões,
como na primeira semana de abril, após o falecimento por conta de um câncer do
prisioneiro Maysara Abu Madyieh (dia 2 de abril), que trabalhou para as forças
de segurança da Autoridade Palestina (AP), preso desde 2002. Ele servia prisão perpétua e, segundo disse
Issa Qarage, Ministro de Assuntos de Prisioneiros da Autoridade Palestina, à
MaanNews, na semana de sua morte, a autópsia mostrava que o Serviço Prisional
Israelense (SPI) foi negligente no tratamento de seu câncer. A acusação era que
apenas lhe davam antibióticos e analgésicos.
A organização Médicos Pelos
Diretos Humanos de Israel (PHR-Israel) lançou hoje o relatório “Os desafios
políticos, morais, médicos e éticos encontrados no tratamento de prisioneiros
palestinos em greve de fome em prisões israelenses”. Este destaca que os
serviços médicos e de saúde dados a prisioneiros e detidos não são regulados sob a lei Nacional de
Proteção de Saúde, mas sob a Ordem Pública 1940.
“Como resultado, a equipe médica
nas prisões é empregada pelo SPI. (...) Estando sob a autoridade do Sistema de
Segurança em vez de sob o Ministério da Saúde, o seu senso dúbio de lealdade se
intensifica, como resultado de pressões diretas ou implícitas do sistema de segurança”.
E, no fim, a “greve de fome confirmou o que estava na cabeça de todo o
prisioneiro, que a primeira lealdade dos médicos é à prisão e não ao paciente”.
Em Hebron, na cidade natal de Abu
Madyieh, no segundo dia após a sua morte, durante 6 horas, jovens palestinos
duelaram com o exército israelense em H2, sua parte ocupada. Jovens ateavam
fogo em pneus e os chutavam o mais longe que podiam, formando uma barreira de
fumaça preta que os escondiam dos olhos dos soldados. “Protegidos”, jogavam
pedras em direção à posição israelense. Os soldados respondiam com bombas de
percussão, balas de borracha e de gás lacrimogênio. Até uma nova leva de pneus
serem queimados.
No dia anterior à morte (03/04),
aconteceram confrontos mais violentos perto de Tulkarem, mais ao norte da
Cisjordânia. Dois jovens palestinos foram mortos, Amer Nassar, 17, e Naji
Belbisi, 18.
A morte de Abu Madyieh não gerou o primeiro levante de protestos em
2013. Um mês antes, morreu nas prisões israelenses Arafat Jaradat, também de
Hebron, sob suspeita de tortura. “Ainda não há resultado dos exames
israelenses, mas o médico palestino que acompanhou a autópsia relatou que viu
marcas que mostravam sinais de que foi torturado”, revela Sahar.
Após a morte de Jaradat, 3 dias
de confrontos levantaram a pergunta entre israelenses e palestinos se uma nova
Intifada estava a caminho. Essa obsessão sobre a possibilidade de uma nova
erupção nos territórios se mantém há pelo menos dois anos, quando se iniciou o
atual movimento de greve de fome, ligada aos prisioneiros, que ameaçam ser o
impulso de ruptura da atual ordem estável da Ocupação.
Para Sahar, a pressão sobre os
palestinos pode levar a um confronto final para estabelecer as bases do domínio
israelense na Cisjordânia. “Há mais prisões desde o final de 2012. Há mais
ataques de colonos, confisco de terras, demolição de casas, todas as diferentes
violações aumentam. Devem acreditar que em certo momento será a última chance
para eles. Eles sabem que chegará a um ponto em que terão que dar respostas,
talvez não na questão de fronteiras, mas definitivamente na questão de
assentamentos e de prisioneiros. O aumento nas detenções está relacionado a
esse quadro”
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*Arturo Hartmann: 'jornalista e atualmente participa da
produção do documentário “Sobre Futebol e Barreiras”, filmado em Israel e
Palestina durante a Copa do Mundo da África.
*Fonte: Opera Mundi


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