segunda-feira, 13 de maio de 2013

Carros brasileiros são mais letais


Carros brasileiros são inseguros, segundo especialistas




Os automóveis fabricados no Brasil possuem soldos fracos, escassos recursos de segurança e materiais inferiores, se comparados a modelos feitos para americanos e europeus



Uma interminável fila de carros sai da linha das maiores montadoras – mais de 100 mil por dia –, direto para as mãos da faminta classe média brasileira. Os novos Fords, Fiats e Chevrolets brilhantes contam a história de uma economia que pleno florescimento que alimenta a quarta maior indústria de automóveis do mundo.

Uma vez que estes veículos chegam às ruas, porém, ocorre uma tragédia nacional, afirmam especialistas, com milhares de brasileiros morrendo todos os anos em acidentes de carro, que em muitos casos, não seriam comprovadamente fatais.

Os culpados são os próprios carros, produzidos com soldos fracos, escassos recursos de segurança e materiais inferiores, se comparados a modelos similares fabricados para consumidores americanos e europeus, de acordo com especialistas e engenheiros que trabalham nesta indústria. Quatro dos carros brasileiros mais vendidos falharam um testes independentes de segurança.

Carros inseguros, juntamente com as pergirosas condições das estradas de países sul-americanos, resultaram em uma taxa de mortalidade em acidentes de carro quase quatro vezes maiores que nos EUA, segundo um levantamento do Ministério da Saúde brasileiro sobre mortes comparadas ao tamanho da frota de cada país.

De fato, os dois países estão se movendo em direções opostas quanto à taxa de sobrevivência – os EUA registraram 40% menos mortes em acidentes de carros em 2010, comparados a uma década antes. No Brasil, o número de mortos cresceu 72%, de acordo com os últimos dados disponíveis.

O médico Dirceu Alves, da Abramet, associação de profissionais especializados em tratar vítimas de acidentes de trânsito, afirma que automóveis produzidos precariamente provocam um ônus desnecessário.

“A gravidade dos ferimentos que chegam aos hospitais é simplesmente horrível”, relata, “e não deveriam acontecer”.

As montadoras brasileiras observam que seus carros atendem às normas de segurança do País. Algumas afirmaram que fabricaram carros até mais seguros para o País devido à baixa manutenção das rodovias e rejeitaram a ideia de que cortes de custos levam às mortes.

Mas os poucos ativistas em segurança no Brasil notam um duplo padrão de mortes, com montadoras ganhando mais dinheiro com a venda de carros que oferecem aos motoristas menos dispositivos de segurança – uma lacuna preocupante para as novas famílias de classe média, cujo crescente poder de compra ultrapassou as proteções ao consumidor levadas a sério na maior parte dos países desenvolvidos.

O problema se estende além do Brasil, com projeções econômicas mostrando que a maioria do crescimento global em vendas de automóveis acontece em mercados emergentes, enquanto a frota mundial de carros dobrará para 1,5 bilhões até 2020.

“Carros novos no Brasil são incrivelmente perigosos, isto não pode ser negado. A taxa de mortalidade em acidentes está muito alta”, afirma Maria Ines Dolci, coordenadora da associação de defesa do consumidor Proteste. “As montadoras fazem isto porque os carros são mais baratos de produzir e as exigências do consumidor brasileiro são menores. Seu conhecimento em segurança é menor que na Europa e nos EUA”.

A indústria de automóveis tem uma lucro de 10% na fabricação de carros brasileiros, comparado aos 3% nos EUA e à média global de 5%, de acordo com a IHS Automotive.

Apenas no próximo ano uma legislação exigirá air bags frontais e sistemas de freio seguros em todos os carros, componentes de segurança que são padrão há anos em vários países. O País também terá novas regulamentações no papel. Reguladores brasileiros não possuem suas próprias instalações para fazer testes de segurança para verificar a performance dos veículos, nem há laboratórios independentes no país.

Especialistas afirmam que estas exigências, sozinhas, não são suficientes para atender aos padrões básicos de segurança. Alguns modelos vendidos no Brasil, como o chinês JAC J3, receberam apenas uma estrela em testes de impacto, apesar de terem air bags e sistema de freios ABS.

Os modelos mais baratos dos cinco carros mais vendidos, fabricados pela General Motors, Volkswagen e Fiat, receberam uma estrela, de cinco, enquanto outros modelos também tiveram notas ínfimas. Este resultado significa que os carros oferecem mínima segurança em impactos frontais, comparados aos carros com quatro ou cinco estrelas, que são virtualmente o mínimo que os consumidores europeus ou americanos compram.

"Está é definitivamente a diferença entre a vida e a morte”, afirma David Ward, diretor geral da Fundação FIA  para segurança automotiva.

O sistema de suspensão traseira do Ford Ka, vendido na Europa, pontuou quatro estrelas, em um teste da Euro NCAP em 2008. A versão latino-americana recebeu apenas uma estrela.

A Ford reconheceu que o Ka é produzido em uma plafaforma desatualizada, e afirmou que não pode ser comparado à versão europeia de mesmo nome. A empresa afirmou que pretende produzir todos seus carros no Brasil em plataformas mais modernas até 2015.

Nova classe média

Cerca de 40 milhões de brasileiros subiram à classe média na última década com mais renda do que nunca para comprar seu primeiro carro. O potencial de crescimento é enorme: um em cada sete brasileiros compra um automóvel, enquanto a frota de veículos dos EUA cobre quase todos os americanos.

Mas na medida em que as vendas de veículos explodiram no Brasil, também explodiu o número de acidentes e mortes.

Uma análise do Ministério da Saúde mostra que 9.059 ocupantes de veículos morreram no Brasil em acidentes em 2010, de acordo com as estatísticas mais recentes. No mesmo ano, 12.435 pessoas morreram em acidentes nos EUA, embora a frota de passageiros seja cinco vezes maior que no Brasil. Resultado: vítimas de acidentes no Brasil morreram quatro vezes mais que nos EUA.

Os perigos são básicos, segundo engenheiros: falta de proteção ao corpo, baixa qualidade dos metais e plataformas de carros projetadas décadas antes dos novos avanços em segurança.

“A eletricidade usada para fazer um carro é cerca de 20% o custo da estrutura”, afirma Marcilio Alves, professor de engenharia da Universidade de São Paulo e um dos poucos pesquisadores independentes sobre segurança automotiva.

“Se você economiza eletricidade, reduz os custos. Uma forma de economizar é ou reduzir o número de pontos de solda ou usar menos energia para cada um. Isto afeta a performance em uma batida”.

Em um carro sem air bags e com esturtura instável, o maior perigo ao motorista é o volante. Uma estrutura frágil faz com que o volante deslize no peito e abdômen do motorista em impactos frontais, os mais mortais e comuns, causando sérios danos aos órgãos vitais.

Muitos carros brasileiros também não possuem áreas de deformação, que absorvem energia em acidentes. “Se um carro não pode aborver a energia de uma batida, ela logicamente resultará em mais danos e ferimentos aos passageiros”, observa Alves.

Um engenheiro de automóveis que trabalhou por dez anos na Volkswagen e pediu para não ter seu nome publicado, por medo de perder contratos e benefícios, conta que o segredo de um carro ser capaz de suportar testes de impacto são os pontos de solda.

“Suponhamos que seja um carro alemão. É realmente sofisticado e nada falta”. Segundo ele, a versão brasileira parece a mesma de fora, mas tem partes faltando. “Em uma versão incluíram os reforços, em outra não. O que interessa é a forma final. O que há dentro ninguém vê”, diz.

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