'Essa escolha por mim tem um sentido político', diz ator sobre processo movido pelo magistrado |
Ator comete 'tuiticídio' após selar acordo com Gilmar Mendes, do STF, que moveu processo devido a críticas postadas na rede social: 'Eu não sei mais o que eu posso dizer. Fiquei inseguro'
por Gisele Brito |
São Paulo – Ator, petista e
militante político, José de Abreu se tornou um dos mais influentes tuiteiros do
Brasil em função de sua defesa contínua de políticos, como José Dirceu e José
Genoíno em meio ao julgamento do caso do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal
(STF), saiu da rede de microblogs no final da última semana.
A motivação foi o mesmo STF a que
criticou durante todo o segundo semestre do ano passado. Seguido por mais de 75
mil pessoas, Zé de Abreu ganhou um problema quando suas declarações contra o
ministro do Supremo Gilmar Mendes, em dezembro, renderam uma queixa-crime por
injúria e difamação movida pelo magistrado. Na ocasião, o ator escreveu “E o
Gilmar Mendes que contratou o Dadá? 19 anos de cadeia pro contratado. E pro
contratante? Domínio do fato?”. A mensagem aludia a Idalberto Matias de Araújo,
o Dadá, preso pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo e apontado como
espião contratado por Carlinhos Cachoeira.
Certo da derrota na disputa
judicial, o ator desistiu de usar o processo para discutir a liberdade de
expressão no país e fechou um acordo com Mendes em que se compromete a não mais
proferir expressões ofensivas contra o ministro e a doar R$ 10 mil ao Hospital
São João Batista, em Diamantino (MT), cidade natal de Mendes.
Na entrevista a seguir, Zé de
Abreu diz se sentir inseguro para continuar a se manifestar e compara o medo
que sente do Supremo com o que sentia de generais no período da ditadura. E
afirma que pretende processar sete pessoas que usam o microblog para ofendê-lo.
“Já me provaram que eu não posso escrever tudo que quero. Então eu também não
quero escutar tudo que eu não quero.”
Leia trechos da entrevista
realizada por telefone na tarde de hoje (13).
Você chegou a dizer que não iria
se retratar e iria até o fim do processo para discutir liberdade de expressão.
Por que resolveu selar um acordo agora?
O Código Penal não é o lugar para
discutir liberdade. A partir do momento que ele vira um processo, é o Estado e
o Gilmar Mendes, porque é um crime contra a honra, contra mim. Eu, obviamente,
seria condenado, o juiz vai dar uma pena. O lugar para discutir isso era o
Código Civil. As duas vezes que ele me processou foi por uma palavra, uma
coisinha. Um twitter. Não um conjunto. Se eu for pegar todo mundo que me xinga
de ladrão, de petralha, mensaleiro, sócio do José Dirceu ou coisas mais
pesadas. Se for pegar esse tipo de coisa, tem centenas de milhares. Mas isso
não dá para considerar. O que a gente está escolhendo é gente que fala coisas
sérias. Mas é difícil, tem sete que tem pelo menos dez mensagens bem pesadas.
Então você pretende processar
essas pessoas?
Pois é, acho que sim. Porque aí é
a maneira de discutir se pode escrever tudo ou não. Já me provaram que eu não
posso escrever tudo que quero. Então também não quero escutar tudo que não
quero. Tem que ver até onde isso vai. Porque ser processado pelo Gilmar Mendes,
que na semana passada era o homem mais poderoso do Brasil, pelo menos para a
mídia... Você vê aquele monte de senadores, de todos os partidos, Pedro Simon
(PMDB-RS), Ana Amélia (PP-RS), Randolfe Rodrigues (Psol-AP), a Marina Silva
(Rede) foi lá na casa dele pedir (senadores foram ao Supremo para declarar
apoio à liminar do ministro que impediu a tramitação do PL 14, de 2013, que
restringe o acesso dos novos partidos ao tempo de rádio e TV no horário
eleitoral e também aos recursos do fundo partidário). Quer dizer, todo mundo
virou o baba-ovo dele e eu vou brigar sozinho?
Você se sentiu abandonado pelas
pessoas que defende, por isso saiu do twitter?
Não. Abandonado, não. O Twitter
você pode acompanhar mesmo sem estar nele. Não estou lendo com a mesma
assiduidade. Entro para saber o que estão falando de mim.
Mas por que você fechou sua
conta?
Sou muito compulsivo. Vejo uma
injustiça escrita e vou para cima. Não consigo ficar pensando dez vezes antes
de apertar o botão. Eu não sei mais o que eu posso dizer. Fiquei inseguro.
Essa judicialização acaba
provocando o medo de falar?
Claro. Eu estou com medo do
Supremo como eu tinha de general no tempo da ditadura. O mesmo medo. Todo mundo
vai lá puxar o saco dele, até o Randolfe e a Marina. Me dá medo, me dá medo. É
o mesmo pessoal que fez do mensalão esse espetáculo.
É um tipo de censura?
Não é uma espécie de censura. A
coisa é muito sutil. Eu não falei nada do Gilmar Mendes que 500 mil pessoas no
Twitter não tenham falado. Essa escolha por mim tem um sentido político. Tem um
objetivo político. Eu saí na capa do O Globo duas vezes em solidariedade ao
José Dirceu. Eu voltei a fazer política para acabar com esse mito do mensalão,
no dia que o Zé Dirceu saiu da Casa Civil. Eu tinha certeza que essa história
era uma farsa. Isso não sou só eu que estou falando, eu conversei com bastante
gente e realmente tem endereço certo esse processo. Não é aleatório.
Você dá visibilidade ao tema...
Pelo menos uma visibilidade
dentro de um núcleo de pessoas onde não havia essa visibilidade. Eu sou seguido
por todos os grandes jornalista do Brasil, por pessoas que pensam. Tenho muitos
seguidores por causa da novela, mas isso agrava mais a situação. De repente o
telespectador de novela que só recebe informação de um lado estava achando que
o PT só tem ladrão. Aí vê que seu ídolo, entre parênteses, seu ator favorito,
tem uma outra visão sobre a história e fica botando links, frases, atacando e
defendendo. Dizendo 'meus amigos não são ladrões. José Dirceu não é ladrão,
Genoino não é ladrão, o PT não inventou a corrupção no Brasil, o MST não é um
bando de vagabundos'. Isso vindo de uma pessoa que, querendo ou não, tem um
poder: eu tenho o poder da comunicação. E a Globo não se importa. Eu já fui lá
perguntar um tempo atrás, voltei agora com essa história da candidatura e nada,
nunca. Não há a menor possibilidade da Globo fazer qualquer coisa contra mim
por conta da minha posição política.
Muita gente acreditava em uma
reação da Rede Globo...
Talvez o Serra tenha ligado na
época da campanha, não sei. Mas a Globo não dá a menor bola, não mistura mesmo.
Nem pode misturar. A Globo não dá nem meu endereço para o oficial de justiça.
E você vai sair candidato a
deputado no ano que vem?
Não. A família ficou muito
contra. A gente conversou muito. Além da família ia ter uma diminuição muito
grande de salário do que eu ganho na Globo e o que eu ganharia como deputado. É
muita diferença. Eu não conseguiria viver. Eu tenho pensão alimentícia, tenho
filho de 12 anos. Ajudo familiares. E tem a história do financiamento de
campanha. Se fosse financiamento público até podia ser. Mas ter que sair
capitando dinheiro para fazer campanha... Eu não aguento fazer isso nem para
fazer teatro pela Lei Rouanet. Deus me livre. O PT, óbvio que iria arcar com
uma boa parte por meio do diretório nacional, mas mesmo assim.
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