O segredo do sucesso da Alemanha
O sistema de formação profissional alemão, com foco no estágio, vai encantando o mundo. |
Presseurop |
Mais de 5,5 milhões de jovens
europeus estão sem emprego. Nos países em crise do sul da Europa, uma geração
está crescendo com poucas perspectivas: um em cada dois espanhóis e gregos com
menos de 25 anos está desempregado, e um em cada três em Itália e Portugal.
Para eles, a Alemanha deve
parecer uma ilha de bem-aventurados: o desemprego jovem fica abaixo dos 8%. Em
nenhum dos restantes membros da União Europeia é tão baixo. Apenas a Áustria se
aproxima (8,9%).
“Como conseguem uma coisa
dessas”, perguntam os nossos vizinhos europeus – e há mesmo quem se desloque à
Alemanha para investigar o fenômeno.
O que descobrem é o nosso sistema
de formação profissional dual: estudar na escola (teoria) e fazer estágios (prática),
em simultâneo e não de forma consecutiva.
Para a maioria dos europeus, isso
é uma novidade: estudo e trabalho, em vez de estudo e depois trabalho.
A Comissão Europeia elogiou o
modelo alemão como forma de “assegurar a ausência de desemprego dos jovens e de
falta de mão de obra qualificada”.
Até o Presidente dos Estados
Unidos, Barack Obama, elogiou o modelo alemão, no seu discurso de 2013 sobre o
Estado da União: “Hoje, países como a Alemanha apostam na formação dos seus
alunos do ensino médio com o equivalente a um grau técnico de um dos nossos
institutos comunitários, como forma de os preparar para exercer uma profissão.”
Durante muito tempo, outros
países criticaram esta abordagem alemã. Para muitos especialistas estrangeiros
em educação, os estudos universitários – licenciaturas, mestrados, doutorados –
são a medida de todas as coisas. O meister
alemão (diploma técnico-profissional) é considerado um exotismo.
A formação prática é considerada
vários furos abaixo da formação acadêmica. Pôr lado a lado um diploma de
formação técnica com os estudos do secundário, ou considerar a certificação de
meister em pé de igualdade com o mestrado universitário, é inconcebível para
muitos europeus.
Mas, lentamente, começa a correr
mundo que a capacidade de inovação da indústria alemã – e o seu êxito, medido
pelo sucesso dos seus produtos em todo o mundo – pode ter a ver com a sólida
formação que os trabalhadores alemães recebem.
Mesmo dentro da Alemanha há
críticos ao sistema. Foi defendido que se trata de uma formação demasiado
especializada, demasiado adaptada às necessidades específicas de determinados
setores, e que o número de especialidades (mais de 300) por que os jovens podem
optar demasiado vasta.
Também foram levantadas dúvidas
sobre se as qualificações do sistema conseguem acompanhar a evolução económica,
na era da Internet.
O sistema sofreu forte pressão há
cerca de uma década, quando houve uma vaga de desemprego em massa na Alemanha e
dezenas de milhares de jovens não conseguiam vagas para estágios. Em 2004, o
governo chegou a impor quotas de estágios para as empresas.
Depois, o governo se juntou aos
empresários e associações patronais para estabelecer o Pacto Nacional de
Formação Profissional e Educativa, que ajudou a inverter a situação: hoje, a
oferta é maior do que a procura.
A crise econômica mundial
transformou o modelo alemão num êxito de exportação. A Alemanha assinou um
acordo de cooperação em formação com seis países da União Europeia, e as
empresas alemãs estão desempenhando um
papel pioneiro na formação de funcionários nas suas filiais no exterior.
As expectativas são elevadas –
mesmo para os alemães. A Alemanha não quer apenas exportar um sistema com
provada excelência; espera também que os europeus dinâmicos e motivados do sul
ocupem todas as vagas de estágio que não estão atualmente preenchidas – e que,
quando obtiverem a desejada qualificação, não voltem para os seus países de
origem, mas fiquem na Alemanha para a preencher a crescente escassez de
trabalhadores qualificados.
Os céticos não perdem tempo em apontar problemas como a barreira
linguística, e duvidam que os imigrantes consigam desempenhar um papel
determinante na recuperação da escassez de estagiários na Alemanha.
De fato, o momento pode não ser o
ideal, pois o sistema alemão é fortemente dependente da economia. Não são os
especialistas em educação mas o mercado quem, em última análise, determina o
número de estágios disponíveis. São as empresas que decidem quantas vagas para
determinadas qualificações vão necessitar no futuro; e é essa a base para se
estabelecer o número de estágios que vão abrir.
Assim, a grande vantagem da
abordagem de formação profissional alemã é também o seu maior inconveniente. O
sistema depende da economia – e, em momentos piores, como o da crise que os
países europeus estão vivendo, a procura de estagiários é menor.
O fato de os europeus do sul
procurarem uma resposta no sistema alemão revela a que ponto estão
desesperados. Faltam-lhes empresas dispostas a criar vagas de estágio e
“mestres” pacientes, dispostos a passar conhecimentos aos “seus” estagiários,
bem como as instituições e a forte cooperação necessária entre empresários,
políticos e sindicatos para implementar aquele sistema com bons resultados.
Mesmo na Alemanha, onde esta colaboração
está já instalada, o sistema ainda não é isento de contratempos. Por isso, a adoção pelos europeus do sul do
modelo alemão pode parecer muito
ambiciosa.
Mas é melhor apontar para uma
reforma estrutural corajosa do que optar pela solução mais fácil, que é dar aos
jovens desempregados formação profissional sem sentido, só para os manter
ocupados – e sem protestarem.
Isso merece o nosso apoio. Do
mesmo modo que os jovens europeus do sul que saem dos seus países e vêm para a
Alemanha em busca de emprego ou de formação profissional.
Devemos recebê-los de braços
abertos.
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