segunda-feira, 20 de maio de 2013

Espanha: Muito mais que Indignados



BY BERNARDO GUTIERREZ – 16/05/2013
POSTED IN: ALTERNATIVAS, CAPA, PÓS-CAPITALISMO


130516-Indignados



Dois anos depois de ocupar praças da Espanha, 15M assume nova forma: múltiplos experimentos de relações sociais e culturais alternativas , numa sociedade em crise

“As velhas manifestações, tão cinzentas e limitadas, tornaram-se obsoletas e inúteis, o que abriu caminho para um infinito de possibilidades. Repensamos a ação, a queixa, as relações, o público, o comum”. No texto coletivo Isso não é uma manifestação, aparecem detalhes que os meios de comunicação de massas ignoram. Isso não é uma manifestação não é um exercício de nostalgia. Não é um anseio daquela vibrante Multidão Que Ocupava as Praças que conformou aquele imprevisível corpo coletivo, aquela trama de afetos a que alguns chamam de “movimento 15M”.

Isso não é uma manifestação é um inventário de detalhes mínimos / máximos, de ações, processos, projetos para os quais servem mal as velhas palavras. Isso não é uma manifestação, dizíamos: “E nossa imaginação transbordou por completo o espaço do possível, construindo já novos mundos dentro da velha carcaça deste em que vivemos”. Isso não é uma manifestação. Isso não é uma soma quantitativa. Isso é mais que uma enumeração de conquistas. Isso é algo mais que um eco daquele “vamos devagar, porque vamos longe”.

Alguns meios de comunicação apressam-se, na Espanha, a enterrar “o que sobra do 15M”. Depois da manifestação do último domingo, convocada nas principais cidades da Espanha, alguns colocarão um obituário sobre o 15M. Contarão cabeças, escolherão a foto mais despovoada. Manipularão inclusive alguma imagem, como se faz nas ditaduras. Comemorarão o enterrro, isolados em sua cova, refletidos no empanado espelho midiático do velo mundo. Não olharão para os detalhes, o processo, o gotejar incessante. Não observarão. Não escutarão. Não lerão este texto.

Certo: o 15M é tão complexo que custa categorizá-lo, explicá-lo, traduzi-lo. Além disso, os olhos veem o que estão acostumados a ver, como lembra Amador Fernández-Savater, no recomendável Ver lo invisible: unicornios y 15M. Mas talvez se possa vislumbrar sua potência transformadora descrevendo pequenos gestos, sonhos em minúsculas, construções coletivas, invisíveis para muitos. O 15M não necessita mais de utopia em maiúsculas, não. Não necessita aquela UTOPIA do maio de 68, aquela estúpida “praia debaixo dos paralelepípedos” que nunca apareceu. Não necessita porque o 15M já construiu sua própria utopia: dezenas, centenas, milhares de microutopias em rede. O 15M não necessita de um modelo utópico porque já tem – um, centenas, milhares – de protótipos reais. Protótipos microutópicos, conectados entre si, conectados (quase) em tempo real.

Palavras-chaves, sim: prototipo. “Exemplar original ou primeiro molde em que se fabrica uma figura ou outra coisa”. A cultura digital, os processos copyleft, a ética hacker tão presentes nos preâmbulos do 15M impregnaram esta nova revolução de multidões conectadas. O protótipo, o novo mundo aberto baseado nos processos, substitui o modelo definitivo. E o 15M não deixou de cozinhar protótipos. Construiu-os coletivamente, em rede, de forma aberta. Naquela Acampada Sol inicial não havia apenas perssoas protestando diante do colapso do sistema. Naquelas acampadas estava o novo protótipo de mundo. E estava nos detalhes. Em suas creches, em suas bibliotecas abertas, em suas hortas, em seus streamings, em seus mecanismos analógicos e digitais para propor mudanças. O 15M – seja um diagnóstico, um movimento, um estado de ânimo ou um conjunto de vínculos humanos – construiu protótipos. E muitos. Jurídicos, urbanos, culturais, econômicos, tecnológicos, comunicativos, políticos, afetivos..

A potência do 15M não está na reação, na (necessária) defesa coletiva do sistema do bem-estar. Sua bomba poético-real está em sua natureza propositiva, criativa, inovadora. Diante da cegueira generalizada de nossos políticos, diante do olho torto da mídia, visibilizar estes protótipos reais, vivos, eportáveis-exportados, é mais necessário que nunca. Não é uma lista, não. Talvez, um ato de justiça poética. Um invetnário subjetivo que conforma algo maior – para o que ainda não temos nome.

Nossa vingança é ser felizes, estamos dizendo faz tempo.
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| Tradução: Antonio Martins

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